Ainda que seja importante discriminar os diferentes custos por sua natureza

Você sabe como discriminar as verbas em um acordo trabalhista?

Já falei bastante sobre acordos no blog, mas percebi que nunca expliquei um passo a passo de como fazer a discriminação, então vamos lá!

O QUE É A DISCRIMINAÇÃO DE UM ACORDO TRABALHISTA?

É a identificação das verbas que estão sendo pagas na conciliação.
Exemplo: acordo de R$ 1.000,00 pode ser discriminado em R$ 500,00 de diferenças de FGTS e R$ 500,00 de indenização do vale transporte.

POR QUE É FEITA A DISCRIMINAÇÃO?

A discriminação do acordo indicará se incidirão descontos previdenciários sobre o valor pactuado.
Veja o que diz  § 3° do artigo 832 da CLT:

(…)
§ 3o As decisões cognitivas ou homologatórias deverão sempre indicar a natureza jurídica das parcelas constantes da condenação ou do acordo homologado, inclusive o limite de responsabilidade de cada parte pelo recolhimento da contribuição previdenciária, se for o caso.

O INSS só incide sobre as verbas salariais, nunca sobre as indenizatórias (por isso que é importante conhecer a natureza jurídica das verbas antes de fazer a discriminação).

QUANDO PRECISO DISCRIMINAR AS VERBAS?

Sempre! O acordo trabalhista pode ser escrito ou verbal, mas a discriminação das verbas é obrigatória.
Aqui no blog tem uma matéria mostrando tudo o que tem que constar em um acordo trabalhista.

QUEM FAZ A DISCRIMINAÇÃO?

Normalmente o advogado da reclamada e do reclamante conversam e decidem sobre a discriminação das verbas, mas se o seu acordo for feito em audiência, pode ser que o próprio juiz faça a discriminação.

QUAIS VERBAS POSSO USAR NA DISCRIMINAÇÃO?

Depende da fase do acordo!

Antes do trânsito em julgado:

Normalmente os juízes só aceitam discriminar as verbas trabalhistas em um acordo conforme aquelas que foram elencadas na petição inicial.
A lei n.º 13.876 de 20/09/19 (que dispõe sobre honorários periciais em ações em que o INSS figure como parte) incluiu no artigo 832 os parágrafos 3º-A e 3º-B:

§ 3º-A.  Para os fins do § 3º deste artigo, salvo na hipótese de o pedido da ação limitar-se expressamente ao reconhecimento de verbas de natureza exclusivamente indenizatória, a parcela referente às verbas de natureza remuneratória não poderá ter como base de cálculo valor inferior:

I – ao salário-mínimo, para as competências que integram o vínculo empregatício reconhecido na decisão cognitiva ou homologatória; ou

II – à diferença entre a remuneração reconhecida como devida na decisão cognitiva ou homologatória e a efetivamente paga pelo empregador, cujo valor total referente a cada competência não será inferior ao salário-mínimo.

§ 3º-B Caso haja piso salarial da categoria definido por acordo ou convenção coletiva de trabalho, o seu valor deverá ser utilizado como base de cálculo para os fins do § 3º-A deste artigo.

De toda forma, como essa legislação é muito recente e não há entendimento consolidado, você pode tentar apontar verbas diferentes, baseando-se na Súmula abaixo:

SÚMULA nº 67/2012 da AGU
Na Reclamação Trabalhista, até o trânsito em julgado, as partes são livres para discriminar a natureza das verbas objeto do acordo judicial para efeito do cálculo da contribuição previdenciária, mesmo que tais valores não correspondam aos pedidos ou à proporção das verbas salariais constantes da petição inicial.

Argumente que a livre discriminação é autorizada pela AGU, que é responsável pela defesa dos interesses da União e do próprio INSS.
Lembrando que o acordo pode ser feito a qualquer momento do processo, ok?

Depois do trânsito em julgado:

Depois do trânsito em julgado segue-se o entendimento do § 6° do artigo 832 da CLT:

(…)
§ 6o  O acordo celebrado após o trânsito em julgado da sentença ou após a elaboração dos cálculos de liquidação de sentença não prejudicará os créditos da União.

Nesse mesmo sentido é a OJ 376 da SDI-1 do TST:

376. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ACORDO HOMOLOGADO EM JUÍZO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. INCIDÊNCIA SOBRE O VALOR HOMOLOGADO. (DEJT divulgado em 19, 20 e 22.04.2010)

É devida a contribuição previdenciária sobre o valor do acordo celebrado e homologado após o trânsito em julgado de decisão judicial, respeitada a proporcionalidade de valores entre as parcelas de natureza salarial e indenizatória deferidas na decisão condenatória e as parcelas objeto do acordo.

Além disso, tem a previsão do § 5° do artigo 43 da Lei 8.212/91:

Art. 43. Nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária o juiz, sob pena de responsabilidade, determinará o imediato recolhimento das importâncias devidas à Seguridade Social.
(…)
§ 5º Na hipótese de acordo celebrado após ter sido proferida decisão de mérito, a contribuição será calculada com base no valor do acordo.

Isso quer dizer que as parcelas não poderão mais ser discriminadas livremente, devendo obedecer o que foi deferido na decisão transitada em julgado.
Ainda assim, o cálculo será feito com base no valor do acordo.

ME DÁ EXEMPLOS DE COMO DISCRIMINAR AS VERBAS EM UM ACORDO TRABALHISTA?

Claro! Vamos lá:

  • Exemplo 1: Acordo de R$ 5.000,00 – salário de R$ 1.500,00 – Pedidos: verbas rescisórias, horas extras, dano moral e PLR – Acordo antes do trânsito

Sugestão de discriminação: R$ 1.500,00 aviso prévio indenizado + R$ 1.500,00 multa do 477 + R$ 1.000 PLR + R$ 1.000,00 danos morais = Total R$ 5.000,00
Nesse caso não há incidência de INSS

  • Exemplo 2: Acordo de R$ 40.000,00 – salário de R$ 8.000,00 – Pedidos: horas extras e dano moral – Acordo antes do trânsito

Sugestão de discriminação: R$ 40.000,00 danos morais = Total R$ 40.000,00
Nesse caso não há incidência de INSS

  • Exemplo 3: Acordo de R$ 20.000,00 – salário de R$ 5.300,00 – Pedidos: horas extras e adicional de periculosidade – Acordo antes do trânsito

Sugestão de discriminação: R$ 20.000,00 bonificação eventual com base na Súmula da AGU = Total R$ 20.000,00
Se o juiz homologar não haverá incidência de INSS
Se o juiz não homologar, aí tem que discriminar como verba salarial mesmo e há incidência de INSS sobre todo o valor.

  • Exemplo 4: Acordo de R$ 10.000,00 – Após trânsito em julgado – Condenação: R$ 8.000,00 horas extras e reflexos (verba salarial) + R$ 5.000,00 férias indenizadas (verba indenizatória)

Sugestão de discriminação: proporcional – R$ 6.200,00 horas extras + R$ 3.800,00 férias indenizadas.
Nesse caso há incidência de INSS apenas sobre R$ 6.200,00.

O JUIZ É OBRIGADO A HOMOLOGAR A DISCRIMINAÇÃO QUE EU FIZ?

Não! Ele pode pedir que seja feita nova discriminação, caso entenda que há algo errado.

QUAL A VANTAGEM DE DISCRIMINAR VERBAS COMO INDENIZATÓRIAS?

A vantagem é que, como eu falei aí em cima, sobre esses valores não serão descontados INSS nem do reclamante, nem da reclamada.

E SE EU NÃO FIZER A DISCRIMINAÇÃO?

Pode ser que todas as verbas sejam consideradas como salariais e o recolhimento previdenciário seja feito sobre o valor total do acordo.

COMO CALCULAR O INSS E O IR?

Sugiro contratar um contador ou leia essa matéria aqui.
Se quiser ler mais sobre o assunto:

  • INSS parte do empregado: tabela aqui
  • INSS parte do empregador: tabela aqui
  • IR: Instrução Normativa aqui

RESUMÃO PASSO A PASSO

  • Anote o valor do acordo
  • Verifique se há ou não o trânsito em julgado
  • Verifique as verbas indenizatórias existentes no processo
  • Distribua o valor do acordo proporcionalmente às verbas
  • Se não existir nenhuma verba indenizatória, tente discriminar conforme Súmula da AGU ou aponte todas como salariais

TIVE UM PROBLEMA NO MEU ACORDO. O QUE FAZER?

Já fiz uma matéria aqui no blog mostrando como agir em caso de acordos problemáticos.
Ainda tem alguma dúvida sobre como discriminar as verbas em um acordo trabalhista ou quer fazer uma contribuição?
Me escreve nos comentários!

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