É possível perceber que o bairro de Copacabana sofreu grandes transformações quais são os aspectos positivos e negativos dessas transformações?

Avenida Paulista em 2008, São Paulo.

O espaço geográfico corresponde ao espaço construído e alterado pelo homem; e pode ser definido com sendo o palco das realizações humanas nas quais estão as relações entre os homens e desses com a natureza. O espaço geográfico abriga o homem e todos os elementos naturais, tais como relevo, clima, vegetação e tudo que nela está inserido.

O espaço geográfico em sua etapa inicial apresentava somente os aspectos físicos ou naturais presentes, como rios, mares, lagos, montanhas, animais, plantas e toda interação e interdependência entre eles. O surgimento do homem, desde o mais primitivo, que começou a interferir no meio a partir do corte de uma árvore para construção de um abrigo e para caça, impactou e transformou o espaço geográfico.

Nesse primeiro momento, as transformações eram quase que insignificantes, uma vez que tudo que se retirava da natureza servia somente para sanar as necessidades básicas de sobrevivência, processo chamado de “meios de existência”. Toda modificação executada na natureza é proveniente do trabalho humano.

É através do trabalho que o homem é capaz de construir e desenvolver tudo aquilo que é indispensável à sua sobrevivência. O termo “trabalho” significa todo esforço físico e mental humano com finalidade de produzir algo útil a si mesmo ou a alguém.

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O conjunto de atividades desempenhadas pelas sociedades continuamente promove a modificação do espaço geográfico. A partir da Primeira Revolução Industrial, o homem enfatizou a retirada de recursos dispostos na natureza a fim de abastecer as indústrias de matéria-prima, que é um item primordial nessa atividade, ao passo que a população crescia acompanhada pelo alto consumo de alimentos e bens de consumo.

Com o avanço tecnológico, o homem criou uma série de mecanismos para facilitar a manipulação dos elementos da natureza, máquinas e equipamentos facilitaram a vida do homem e dinamizaram o processo de exploração de recursos, como os minerais, além do desenvolvimento de toda produção agropecuária com a inserção de tecnologias, como tratores, plantadeiras, colheitadeiras e muitos outros.

Na produção agropecuária se faz necessário transformar o meio, pois retira-se toda cobertura vegetal original que é substituída por pastagens e lavouras. Dessas derivam outros impactos como erosão, poluição e contaminação do solo e dos mananciais.
Na extração mineral, o espaço geográfico é bastante atingido, sofrendo profundos impactos e mudando de forma drástica todo arranjo espacial do lugar que está sendo explorado.

Nos centros urbanos, as alterações são percebidas nas construções presentes, essas transformações ocorrem em loteamentos que em um período era somente uma área desabitada e passou a abrigar construções residenciais, além de áreas destinadas ao comércio e indústria. Desse modo, nas cidades de todo mundo sempre ocorrem modificações no espaço, são identificadas nas novas construções, nas reformas de residências, lojas e todas as formas de edificações.

Diante dessas considerações constata-se que o espaço geográfico não é estático, pois até mesmo a deteriorização de um edifício ou monumento é considerado uma alteração do espaço e automaticamente da paisagem, por isso as mudanças são contínuas e dinâmicas. O espaço geográfico é produto do trabalho humano sobre a natureza e todas as relações sociais ao longo da história.

As constantes intervenções humanas no espaço causam uma infinidade de degradação que recentemente tem se voltado contra o homem. Desse modo, a natureza está devolvendo tudo aquilo que as ações antrópicas causaram. São vários os exemplos decorrentes das profundas alterações ocorridas principalmente no último século no planeta, como o aquecimento global, efeito estufa e escassez de água.

As décadas de exploração ocasionaram a extinção, somente no século XX pelo menos 15% das espécies da fauna e da flora foram extintas.

A partir das afirmativas, fica evidente que o homem necessita da natureza para obter seu sustento, no entanto, o que tem sido promovido é uma exploração irracional dos recursos. Se continuar nesse ritmo, provavelmente as próximas gerações enfrentarão sérios problemas. Além disso, a vida de todos os seres vivos na Terra ficará comprometida, inclusive do homem, caso o problema não seja solucionado.

Introdução

1Em junho de 2014, em um final de tarde ensolarado, encontrei, fortuitamente, com Juscelino na calçada em frente ao botequim Zigzag no bairro de Ipanema, cidade do Rio de Janeiro, Brasil. Juscelino foi um dos principais interlocutores da minha pesquisa de doutorado, tem 62 anos e é nascido e criado no Cantagalo, favela situada nesse bairro. Desde a década de 1980, ele é dono de uma barraca na praia de Ipanema, onde ele aluga cadeiras de praia e vende bebidas e lanches aos frequentadores. O Zigzag é frequentado, majoritariamente, por moradores da rua onde se situa e, em alguns casos, por alguns outros passantes a caminho da praia ou do metrô. Nesse dia, em frente ao ZigZag, Juscelino estava se despedindo de seus amigos de Ipanema, com quem tinha acabado de jogar uma partida de futevôlei na praia.

  • 1 Para mais sobre os diferenciais de renda entre favela e os bairros na cidade do Rio de Janeiro, ver (...)

2As favelas do Cantagalo e do Pavão-Pavãozinho estão presentes nos bairros de Ipanema e Copacabana desde o início do século XX, quando migrantes provenientes das áreas rurais passaram a procurar essas áreas geradoras de emprego e em suas encostas se estabeleceram. Os bairros de Ipanema e Copacabana são famosos pontos turísticos internacionais, seus imóveis são altamente valorizados no mercado imobiliário da cidade e apresentam um alto diferencial de renda em relação às favelas que ali se localizam.1

  • 2 O PAC foi um programa de desenvolvimento do governo federal implementado a nível nacional, mas que (...)

3Em 2010, Juscelino teve a casa de sua família no Cantagalo demolida para a realização de obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)2 e do Metrô-Rio relacionadas à construção de um elevador, que liga a rua do bairro ao topo dessa favela. Com o dinheiro da indenização paga pelo Estado pela demolição da casa, a esposa de Juscelino comprou uma casa em Bonsucesso, subúrbio da cidade, distante cerca de 20 km de Ipanema. Ele, no entanto, não aceitou sair do Cantagalo e ali permaneceu morando sozinho em uma casa pequena.

4No dia do nosso encontro em frente ao botequim ZigZag, perguntei pela família dele, que eu já sabia estar morando em Bonsucesso. Respondendo à minha pergunta sobre como estava a família, ele reforçou algo que já falava desde que a esposa dele avisou que queria comprar uma casa lá. Juscelino comentou em tom de irritação:

Aquilo lá é muito longe! Aquele trem para lá é um calor infernal! E pior ainda é viver com aqueles suburbanos. Não é falar mal deles não, mas você sabe que é diferente! Você vai à praia aqui em frente e você vê de longe a diferença! É um tal de trazer rádio, isopor, jogar areia um no outro, se enterrar na areia e se afogam. Ih... é diferente da gente daqui! A maneira de ir à praia deles é diferente da nossa! Não dá não!

5Por oposição ao morador do subúrbio carioca, em sua fala, Juscelino se coloca como “gente daqui” – de Ipanema –, destacando o sentimento de pertencimento que tem em relação a esse bairro. Sua fala ressalta ainda a identificação dele com um estilo de vida, mais especificamente com o modo de frequentação da praia dos moradores de Ipanema, que ele destaca ser “diferente” do morador do subúrbio carioca. A barraca de Juscelino na praia, além de sua principal fonte de renda, é também o local que o coloca em contato cotidiano com seus frequentadores, em sua maioria, moradores de classe média e alta do bairro de Ipanema. Ao longo dos anos, através de sua notável habilidade social, Juscelino estabeleceu uma relação próxima com esses frequentadores, que se tornaram uma importante rede de contatos. Tal rede pode ser acionada em situações diversas, que permitem, por exemplo, conseguir uma consulta com um dentista para fazer uma obturação no dente do seu neto.

  • 3 O trabalho de investigação realizado no âmbito do meu doutorado (Cunha, 2014) teve financiado da Fa (...)

6Entre 2009 e 2014 realizei o trabalho de campo nas favelas do Cantagalo e do Pavão-Pavãozinho, que deu origem à minha tese de doutorado.3 Nessa ocasião, através do método etnográfico, acompanhei o processo de implementação do PAC e da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) nessas duas favelas vizinhas, abordando a forma como os moradores dessas favelas se relacionavam entre si e também a forma como se colocavam diante do Estado para expor demandas e assegurar objetivos diante dessas políticas públicas. Além de observação participante, realizei entrevistas semiestruturadas com alguns dos meus principais interlocutores, a fim de registrar como havia se dado a chegada deles nessas favelas e o processo inicial de ocupação de tais encostas. Este tipo de entrevista facilita a “produção de informações sintomáticas que correriam o risco de serem censuradas num outro tipo de entrevista” (Michelat, 1982: 193).

7O encontro com Juscelino em uma calçada de Ipanema, quase ao final do meu trabalho de campo para a referida tese, despertou o meu interesse em começar a pensar em uma outra questão: a forma como os moradores dessas favelas percebem as suas experiências de circulação e apropriação do espaço dos bairros onde estão situadas. Após algum tempo e muitas leituras, para responder a tal questão, decidi revisitar as entrevistas semiestruturadas realizadas na pesquisa anterior.

  • 4 Valladares (2005) nos lembra que o livro Cidade partida, escrito em 1994 pelo jornalista Zuenir Ven (...)

8Assim, como é característico a esse tipo de entrevista, na ocasião de sua realização, foi criado espaço para o surgimento de outros assuntos trazidos por meus interlocutores, independente das questões, inicialmente, por mim colocadas. É nesse contexto que o tema da circulação deles pelas ruas dos bairros de Ipanema e Copacabana apareceu com frequência nessas entrevistas. Na ocasião, tais entrevistas foram gravadas e transcritas, permitindo que, alguns anos depois, o material pudesse ser relido, na busca de respostas para a nova questão por mim colocada. Tal material não foi devidamente analisado na tese e o presente artigo trata de revisitar quatro dessas entrevistas, agora em diálogo com a bibliografia sobre as distintas formas de perceber a relação entre favela e cidade.4

9O presente trabalho busca pensar, portanto, a circulação e os encontros dos moradores dessas favelas pelas ruas e praia dos bairros, bem como os vínculos afetivos e empregatícios por eles ali estabelecidos. O foco do artigo está nas narrativas de quatro interlocutores sobre as suas dinâmicas de produção do espaço urbano, onde suas trajetórias individuais cruzam com as de moradores dos bairros, através de pontos de conexão. O presente artigo pretende afastar-se, assim, das interpretações correntes da exclusão social, procurando destacar e reafirmar a importância de pensar as favelas e periferias não em termos de ausência ou de vazios. As favelas serão tratadas nesse artigo como margens, no sentido proposto por Das e Poole (2004) ou Cunha e Feltran (2013), que se negam a pensá-las como uma parte separada da cidade e buscam abordá-las em suas relações com o centro, destacando seus papéis como os supostos necessários do Estado e da cidade.

1. Sobre as favelas e os bairros em questão

10Em apenas cinco décadas no século passado, entre 1940 e 1980, a população brasileira passou de majoritariamente rural para majoritariamente urbana. Em 2010, o resultado do censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que a população urbana do Brasil correspondia a 84,4%, indicando a constituição de uma sociedade urbana (IBGE, 2010). Uma das mais aceleradas urbanizações do mundo aconteceu com diversos problemas no que diz respeito à inserção urbana daqueles que abandonaram, e continuam a abandonar, o meio rural brasileiro. Tal concentração populacional deu-se sem o correspondente crescimento da oferta de infraestrutura física (moradias, saneamento, transporte público), social (educação, saúde, lazer), emprego e renda, caracterizando a “espoliação urbana” brasileira e o nosso modelo de “urbanização periférica”, tal como proposto por Kowarick (1979).

11No vasto e diverso universo dos 5565 municípios brasileiros são raras as cidades que não têm uma parte significativa de sua população “assentada precariamente”. Segundo dados do último censo do IBGE, em 2010, 6% da população brasileira vivia em favelas. Na região metropolitana do Rio de Janeiro, o percentual era 14,4%, ao passo que na própria cidade, o número chegava a 22% e era equivalente a 1,4 milhão de habitantes distribuídos pelas 763 favelas nela então existentes (IBGE, 2010).

12As favelas do Cantagalo e do Pavão-Pavãozinho localizam-se entre três dos bairros mais valorizados no mercado imobiliário da cidade do Rio de Janeiro: Ipanema, Copacabana e Lagoa. Tais favelas são tratadas pelo poder público, frequentemente, como um todo integrado e uniforme, o chamado “Complexo Pavão-Pavãozinho-Cantagalo”. Segundo o censo do IBGE (2010), a sua população total é de 10 338 habitantes, sendo 5567 do Pavão-Pavãozinho e 4771 do Cantagalo. Trata-se de duas favelas vizinhas que têm seus principais acessos localizados a três ou quatro quadras das internacionalmente famosas praias de Ipanema e de Copacabana. O Cantagalo possui três acessos pelo bairro de Ipanema e o Pavão-Pavãozinho dois por Copacabana. O Cantagalo faz fronteira com o Pavão-Pavãozinho, sendo, portanto, interligadas internamente.

13De acordo com Cunha (2014, 2019), por trás do chamado “Complexo Pavão-Pavãozinho-Cantagalo”, do ponto de vista dos moradores, existem duas favelas vizinhas, porém distintas: o Cantagalo e o Pavão-Pavãozinho. As favelas ocupam o mesmo terreno rochoso, o chamado morro do Cantagalo, mas seus moradores não concebem esse território como um todo indiferenciado, amorfo e uniforme. Frequentemente, os moradores, através de suas narrativas, reforçam rivalidades e disputas, construindo e reforçando, assim, suas identidades em oposição aos seus vizinhos. Tais moradores estão orientados em suas práticas sociais cotidianas por uma complexa trama de disputas e hostilidades, mas que, em determinadas situações sociais, cede lugar à cooperação diante de algum objetivo específico.

14Ainda que sejam frequentemente tratadas pelo poder público como um todo coeso, integrado e homogêneo, essas favelas apresentam origens e histórias de formação distintas. Segundo a autora, com algumas divergências em relação às datas, em geral, a história que os moradores dessas favelas contam sobre eles mesmos é que a ocupação local teve início, ainda em 1910, com a chegada de alguns poucos primeiros ocupantes ao Cantagalo. Pouco depois, a ocupação se estendeu pela encosta do morro, com o começo da formação da favela do Pavão-Pavãozinho. Conforme contam, os primeiros moradores a ocuparem o Cantagalo eram do estado de Minas Gerais ou do interior do estado do Rio de Janeiro e, em sua maioria, eram negros. Para o Pavão-Pavãozinho também foram algumas dessas famílias, porém, a partir da década de 1950 e, de maneira mais intensa, a partir da década de 1980, tal local passou a receber um fluxo significativo de migrantes da região Nordeste do país, que ali se concentrou, expandindo a favela em direção ao Cantagalo. Esses migrantes do Nordeste, com algumas exceções, não se fixaram no Cantagalo, que permaneceu ocupado, predominantemente, pelas antigas famílias de negros vindas de Minas Gerais e do interior do Estado. Atualmente, portanto, os nordestinos são maioria no Pavão-Pavãozinho, ao passo que no Cantagalo é notável a presença de uma grande maioria negra.

15Segundo Lago (2000), no Rio de Janeiro, entre as décadas de 1930 e 1940, o padrão dicotômico centro rico vs. periferia pobre, implementado nas duas décadas anteriores, sofreu alterações. As áreas centrais mais valorizadas e rentáveis para as empresas imobiliárias e de serviços urbanos, a então crescente Zona Sul, começaram a receber grande contingente de trabalhadores pobres, impedindo a total homogeneização dessas áreas. A partir da década de 1930, migrantes provenientes das áreas rurais passam a procurar essas áreas geradoras de emprego e em suas encostas se estabelecem. Transformada em importante mercado de trabalho especializado no setor terciário, a zona sul, especialmente Copacabana, passou a atrair uma quantidade de mão de obra barata, que veio a ocupar os terrenos íngremes até então desvalorizados pela empresa imobiliária, dando origem a novas favelas.

16Segundo Abreu (2013), a década de 1940 foi o período de maior proliferação de favelas na cidade do Rio de Janeiro. O censo de 1948, segundo o autor, revelou um total de 138 837 habitantes nas 105 favelas existentes, que se concentravam notadamente na área suburbana (44% das favelas), seguidas da zona sul (24% e da zona Centro-Tijuca (22%). A importância da localização próxima ao trabalho ficou também evidente, uma vez que 77% dos favelados do centro e 79% daqueles da zona sul trabalhavam na própria zona de residência. Abreu (2013) destaca ainda que o setor secundário absorvia 30% da população favelada, seguida da construção civil e dos serviços domésticos (20% cada). Estas últimas duas fontes de emprego localizavam-se sobretudo na zona sul.

17O bairro de Copacabana foi estudado por Velho (2002 [1973]), na década de 1970, como um bairro rejeitado por alguns, mas extremamente valorizado por outros, que para lá se mudavam na busca de “melhorar de vida”. O autor desenvolveu um clássico estudo em que o foco foi colocado na interação social, no convívio e na tensão social entre os moradores de Copacabana, destacando a diversidade da população e a heterogeneidade do bairro. As favelas do bairro, o Pavão-Pavãozinho, não aparecem, no entanto, nesse estudo.

18Ao descrever o bairro, Velho (ibidem) destaca o processo vivenciado ao longo do século XX, no qual Copacabana deixou de ser um bairro isolado ou paradisíaco à beira-mar e transformou-se numa espécie de “outro centro da cidade”, onde as pessoas vão para fazer compras e se divertir, mas, cada vez mais, para trabalhar. Segundo o autor, uma das categorias profissionais mais numerosas no bairro é a constituída pelas empregadas domésticas. Em suas palavras:

A maioria mora no local de trabalho, nos chamados “quartos de empregadas”, cubículos mal ventilados. Outras vão diariamente para suas casas. Muitas residiam nas favelas da Zona Sul que forneciam mão de obra numerosa e barata para os trabalhos domésticos. Com a remoção das favelas (Praia do Pinto, Catacumba, etc.) ou passam a dormir no emprego ou a fazer enormes viagens diárias de remotos subúrbios para Copacabana, consumindo grande parte de seu salário em passagens de trens e ônibus. (ibidem: 28)

19O autor faz referência às remoções de favelas, que tiveram início na cidade na década de 1960 e estavam em curso na década de 1970, período em que ele realizava a sua pesquisa. Entre as décadas de 1960 e 1970, grande parte da população favelada, especialmente a de favelas localizadas em áreas valorizadas da cidade, foi removida para conjuntos habitacionais distantes do centro, financiados pelo Banco Nacional de Habitação (BNH) e comercializados pela Cohab. Em um período de 12 anos, a operação erradicou 80 favelas, demoliu 26 193 barracos e removeu 139 218 pessoas (Valladares, 2005: 130).

20O Pavão-Pavãozinho e o Cantagalo, assim como outras favelas da zona sul, no entanto, não foram removidas por essas políticas e seguem até os dias de hoje localizadas nos mesmos bairros onde surgiram. Certamente, na década de 1970, quando o estudo foi realizado pelo autor, o Pavão-Pavãozinho não tinha o impacto na vida do bairro que tem hoje em dia. De todo modo, é intrigante que nenhuma referência a essa favela tenha sido feita nesse trabalho. O bairro é analisado pelo autor, a partir do Edifício Estrela, destacando a diversidade de ocupações profissionais e dos bairros de origem de seus moradores. O foco da análise é colocado na diversidade interna do bairro, tendo destaque as tensões entre os moradores vindos do subúrbio e os da zona sul, ao passo que os moradores da favela do bairro não aparecem nas interações sociais abordadas.

21O’Donnell (2013) em seu trabalho, envolvendo uma sólida pesquisa histórica sobre a formação do bairro de Copacabana e o projeto de prestígio pensado para o bairro pela elite, ressalta que os relatos sobre a presença de moradores nos morros são bastante raros no início do século XX. Ainda que com pouco registros históricos da presença da favela, a autora relata que, no início de sua formação, o bairro de Copacabana não era habitado apelas pela elite e pelos pescadores, mas também por trabalhadores que habitavam os morros. Em suas palavras, trata-se de

um quadro de grande diversidade (para não dizer heterogeneidade) social. Vemos grupos de origens, atividades e estratégias diferenciadas ocupando um mesmo bairro e compartilhando, cada qual à sua maneira, o denominador comum oferecido pela ideia de “paraíso” – seja ele reproduzido pelo discurso do isolamento e da paz por parte dos moradores do morro, do entusiasmo associativista dos pescadores ou, ainda, do apreço ao bucolismo salubre ansiado pelos agentes do progresso. (ibidem: 69)

22O’Donnell (2013) argumenta que, longe da unicidade com que é recorrentemente tratado o período inicial de sua ocupação, Copacabana já se prestava, nos primeiros anos do século XX, a diferentes formas de uso do espaço. Ainda que a favela não seja o foco do seu trabalho, a autora registra a presença dela e de seus moradores na formação desse bairro.

23Progressivamente, a partir da década de 1980, fez-se presente uma nova orientação política em relação às favelas, na qual a proposta de remoção em massa não é mais aceita como solução do problema favela. Ao propor a regularização fundiária e a urbanização das mesmas, essa nova orientação marcou um afastamento do paradigma das remoções e inaugurou um outro: o da “integração” à cidade dita “formal”. Diversos foram os fatores que teriam influenciado essa mudança de orientação. Dentre eles, destacam-se as dificuldades de financiamento da remoção em massa construída sobre um esquema econômico que se revelou inviável na prática; a resistência política dos favelados, que sempre se opuseram à remoção; e também o próprio crescimento da população favelada.

24Independente dos fatos que tenham levado a essa mudança de paradigmas, interessa aqui ressaltar que, ao contrário do ocorrido em favelas vizinhas, como a da Catacumba e Praia do Pinto, o “Complexo Pavão-Pavãozinho-Cantagalo” não foi atingido durante o período das grandes remoções e passou ainda, no período seguinte, a ser palco privilegiado do início da atuação das políticas públicas visando à dita “integração”. Tais favelas receberam programas como o pioneiro “Cada Família, Um Lote” do governador Leonel Brizola (1983-1986) e depois o Favela-Bairro, do prefeito Cesar Maia (em 1993).

  • 5 Para mais sobre o processo de regularização urbanística e fundiária nessas favelas, ver Cunha (2012 (...)

25A partir de fins de 2007, a resolução do “problema favela” tornou-se foco de uma série de iniciativas do poder público. O chamado “Complexo Pavão-Pavãozinho-Cantagalo”, assim como outras favelas da cidade do Rio de Janeiro, tornaram-se alvo da intervenção de políticas públicas envolvendo preparação da cidade para sediar megaeventos internacionais, como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. A intervenção pela qual o “Complexo Pavão-Pavãozinho-Cantagalo” passou engloba as obras de infraestrutura e reurbanização do PAC, a instalação de uma UPP e, ainda, o processo de regularização urbanística e fundiária.5

26Esse “pacote” de urbanização conjugado com a militarização foi chamado por Cavalcanti (2013) de “PACificação” e apresenta um discurso fortemente marcado pelo paradigma de “integração” dessa área à cidade dita formal. A proposta de “integração” foi amplamente exaltada através do PAC e da UPP, que, por meio da urbanização e militarização, estariam transformando-as favelas em espaços aptos a fazerem parte da dita “cidade formal”. Um exemplo bem marcante do discurso da integração das favelas foi o realizado na inauguração do elevador construído no Cantagalo pelo PAC, que liga as ruas do bairro de Ipanema ao topo do morro. Em 2010, na inauguração desse elevador, o então governador do Estado do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, disse que o elevador “é o verdadeiro elo de uma cidade que não está mais partida”. A ideia da “construção de pontes” em oposição aos muros da dita “cidade partida” foi acionada largamente ao longo desse discurso.

  • 6 Consultado a 10.04.2014, em //uppsocial.org/territorios/pavao-pavaozinho-cantagalo/?secao=inic (...)

27Após o processo que envolveu a atuação dessas políticas nas favelas da cidade, no ano de 2014, a Prefeitura do Rio de Janeiro, através do Instituto Pereira Passos (IPP) e da UPP Social, divulgou um documento chamado “Panorama dos Territórios-UPP Pavão-Pavãozinho-Cantagalo”.6 Nesse documento, com base nos dados do censo do IBGE (2010), as duas favelas em questão e outras que não foram removidas, são classificadas como “assentamentos urbanizados” ou “ex-favelas”, ressaltando o resultado positivo das intervenções na preparação da cidade para os megaeventos internacionais.

28Segundo Cunha (2014), tal documento apresenta em números a situação do saneamento básico (água e esgotamento sanitário) no chamado “Complexo Pavão-Pavãozinho-Cantagalo”. Em relação ao abastecimento de água, segundo o documento:

Entende-se aqui como abastecimento de água adequado o número total de domicílios cujos moradores declararam que suas residências estavam ligadas à rede geral de água, enquanto que inadequado refere-se àqueles que responderam que seus domicílios têm outras formas de abastecimento, por exemplo, proveniente de poços, rios ou através de caminhões pipa. Conforme mostra a tabela, 99,2% dos domicílios da UPP têm abastecimento de água considerado adequado, média bastante próxima das R.A.s (99,9% Copacabana e 99,6% Lagoa) e do Município do Rio de Janeiro (98,5%). (p. 6)

29Da mesma forma, em relação ao esgotamento sanitário, tanto o Pavão-Pavãozinho, quanto o Cantagalo têm praticamente 100% dos seus domicílios com esgotamento sanitário considerado adequado, a média é de 99,2% e é novamente no documento equiparada à média do “asfalto”. Em relação à energia, 73,4% dos domicílios das favelas utilizam energia de companhia distribuidora e 26,6% dos domicílios da UPP utilizam energia de “outras fontes”. Na prática, “outras fontes” seriam os “gatos” e, assim, novamente, quase 100% dos domicílios estão ligados à companhia distribuidora de energia. De acordo com essas informações divulgadas pela Prefeitura, as favelas em questão desfrutariam de serviços como água, esgotamento e coleta de lixo, tal como os bairros de Ipanema e Copacabana, onde se localizam.

30O que os números, no entanto, não explicam, por exemplo, são os tonéis nas portas das casas de muitos moradores dessas duas favelas, conforme destacado por Cunha (2014). Tais tonéis são utilizados para armazenar água, forma encontrada pelos moradores para lidar com os muitos dias em que ela não chega até suas casas. Tais números também não explicam a existência da prática da “manobra”, sistema local através do qual o curso da água encanada, a cada dia é direcionado para uma determinada área das favelas por um morador (“manobreiro”), pois a rede pública não chega para todos. Os tonéis e a “manobra” não são artefatos do passado, mas sim observados ao longo do meu trabalho de campo.

31Se os dados anunciados pela Prefeitura, levam a crer que os moradores dessas favelas desfrutam dos mesmos serviços de urbanização e infraestrutura que aqueles disponíveis no asfalto, uma simples volta pelas favelas sinaliza na direção contrária. De acordo com o documento, na pesquisa estatística realizada bastava que o morador declarasse que o “domicílio” estava conectado com a rede, seja de água ou esgotamento, por exemplo, para que fosse considerado “adequado”, pouco importando, no entanto, se o serviço de fato funciona.

32No mesmo documento da Prefeitura são divulgados ainda dados relacionados à educação nesse “território”. Não há números sobre frequência escolar e nem sobre o nível de escolaridade. Os dados apresentados não revelam o número de crianças que frequentam a escola e, portanto, se a demanda está sendo atendida. O que é ressaltado como aspecto importante é o número de crianças simplesmente alfabetizadas:

A próxima tabela, 17, apresenta o total e o percentual de alfabetizados e não alfabetizados entre as pessoas de 15 anos ou mais de idade. Trata-se de uma informação extremamente relevante porque esse dado é um indicador de desenvolvimento social importante para analistas e gestores públicos, pois indica um alto grau de vulnerabilidade social. Na UPP Pavão-Pavãozinho e Cantagalo, 93,6% das pessoas nessa faixa etária são alfabetizadas (p. 12).

33No asfalto, tais números sobre alfabetização são de 98,9% em Copacabana e 99% na Lagoa. Apesar de mostrarem alguma diferença nos números sobre educação no asfalto e na favela, a discrepância seria muito maior se a avaliação abordasse níveis de escolaridade como, pelo menos, o ensino médio. Em 2011, uma pesquisa quantitativa foi realizada no Cantagalo por pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas. A partir de tal pesquisa realizada em 802 moradores, Oliveira (2012: 35) revela: “Há no Cantagalo 73% dos entrevistados no grupo de baixa escolaridade, ou seja, aqueles com 18 anos de idade ou mais, que não completaram o ensino médio”.

  • 7 Daflon, Rogério (2011), “Cidade ganha 44 ex-favelas”, O Globo, 29 de maio, p. 19.

34Muito pouco é necessário para que o serviço prestado na favela seja divulgado nesse documento como “adequado” e, portanto, equivalente ao do “asfalto”. Tais favelas passaram, segundo as classificações da Prefeitura, a serem consideradas “ex-favelas”, “comunidades urbanizadas” ou bairros. Esses termos designariam favelas que “já contam com serviços básicos idênticos aos desfrutados por moradores do asfalto”.7

35Apesar de ter sido alvo de algumas das mais importantes políticas públicas de urbanização de favelas, grave ainda é a precariedade do funcionamento dos serviços e equipamentos urbanos disponíveis a seus moradores, destacando-se, assim, a maneira específica através da qual o Estado se relaciona com essas áreas da cidade. Além disso, os moradores dessas duas favelas possuem graus relativamente variados no que diz respeito à sua renda, ao nível educacional, às condições de suas habitações e ao tipo de ocupação que exercem no mercado de trabalho. É possível encontrar casas de pau-a-pique e barracos precários de madeira, ao mesmo tempo em que não é raro observar casas de dois ou mais andares com ótima qualidade construtiva. A variedade de situações econômicas e sociais dos moradores e de suas moradias é grande nas duas favelas. O contraste em relação ao nível socioeconômico dos bairros de Ipanema e Copacabana, no entanto, é ainda mais marcante que a variação de situações internas às favelas.

2. Das relações dos moradores das favelas com os dos bairros em que se situam

36O mesmo sentimento de pertença ao bairro de Ipanema que aparece na fala de Juscelino, tal como descrito no início deste artigo, foi encontrado em entrevistas realizadas, na ocasião do trabalho de campo para a tese de doutorado, entre 2010 e 2014, com antigos moradores do Cantagalo e do Pavão-Pavãozinho (Cunha, 2014). Foi com imenso orgulho, por exemplo, que moradores do Pavão-Pavãozinho contaram sobre a escolha da imagem do famoso calçadão de Copacabana para ser o símbolo da importante bandeira da escola de samba dessa favela, por eles nomeada, em 1994, de “Alegria de Copacabana”. As referências à Copacabana estão no nome, no logo da bandeira e nas letras dos sambas-enredos dessa escola, tornando notória a forma como se identificam não apenas com a favela, mas também com o bairro no qual essa se localiza.

37Esse sentimento de pertença em relação ao bairro aparece nas narrativas dos moradores dessas favelas, ao mesmo tempo e na mesma proporção em que as situações de estigmatização, de segregação e da construção de alteridades por eles ali vivenciadas. Conforme conta Cláudio Coelho, nascido no Cantagalo, 59 anos e, atualmente, renomado treinador de boxe:

Quando eu comecei a dar aula particular de boxe no início de 1990, eu ia dar aula em alguns lugares chiques aqui embaixo mesmo Ipanema, Lagoa e tal. Aí, quando a mãe de aluno ou pai sabia que eu morava na favela, simplesmente arrumava uma maneira de tirar o aluno das aulas. E isso eu percebia porque eles me indagavam querendo saber se eu tinha envolvimento com tráfico de drogas e eu dizia que não, que a minha criação não era essa. Mas aí não adiantava e eles arrumavam uma maneira de tirar o filho, porque imaginavam que amanhã ou depois eu podia estar levando droga para o filho ou até mesmo assaltar a casa deles. Porque essa é a imagem que eles tinham da gente daqui da favela.

  • 8 O processo de estigmatização é uma forma de categorização social através da qual se identifica de f (...)

38Atualmente, o treinador tem uma prestigiada academia de boxe no Cantagalo, que, além de ser um projeto social para crianças e jovens dessa favela, recebe atletas profissionais renomados que vão até lá treinar. Cláudio lembra-se das dificuldades enfrentadas no começo da sua carreira, no início da década de 1990, quando sofria com o estigma de “morador de favela”, categoria que, na percepção dos pais dos seus alunos dos bairros de Ipanema e Copacabana, vinha obrigatoriamente atrelada à condição de traficante de drogas ou ladrão.8 Nesse caso, nenhuma das outras características pessoais do treinador de boxe importavam. O estigma “favelado” se sobrepunha e aniquilava todas outras qualidades, naquele momento, inviabilizando as suas aulas.

39Outra situação que se destaca foi narrada por Dona Alzelina, 89 anos, nascida no Pavão-Pavãozinho. Enquanto ela me contava sobre sua trajetória como cozinheira e inspetora em uma escola pública no bairro de Copacabana, Alzelina acabou trazendo uma importante situação do passado, que evidencia os acessos desiguais aos serviços do bairro, como a educação. Segunda contou, no passado, até cerca da década de 1980, as crianças dessas duas favelas, dificilmente conseguiam estudar nas escolas públicas dos bairros por não terem um endereço que fosse aceito na hora da matrícula, restando-lhes a escola improvisada na Associação de Moradores da favela. Sem um endereço no cadastro oficial da cidade, dentre outras coisas, os alunos ficavam sem acesso às escolas públicas do bairro. Conforme conta Dona Alzelina:

O pessoal do Galo [Cantagalo] e pessoal do Pavão-Pavãozinho, não podia estudar na escola onde eu trabalhava. Porque tinha que ser assim: quem é daqui do morro, estudava na Associação [de moradores], que era a Escola São Pedro. Então quem era daqui da favela só podia estudar lá. Não podia estudar na Penedo e nem na Castelo Novo [escolas do asfalto].

40Dona Alzelina trabalhou muitos anos na Escola Estadual Castelo Novo, em Copacabana, como inspetora e também como cozinheira. Ela conta ainda que, a fim de burlar essa situação, ela aconselhava às mães das crianças da favela a darem o endereço dos seus empregos nos bairros de Ipanema e Copacabana, como se fosse o da residência delas. Com o endereço do asfalto, em geral das casas onde trabalhavam como empregadas domésticas, segundo conta Alzelina, as mães conseguiam fazer a matrícula nas escolas públicas dos bairros.

41Em meio ao material revisitado das entrevistas, chamou atenção a interessante narrativa de Seu Dionísio, 67 anos e nascido no Pavão-Pavãozinho. Ele nos contou sobre uma certa distância ou cerimônia que deveria ser preservada na relação dele e de sua mãe com os patrões de uma casa de família de Copacabana, na qual ela trabalhava:

Ela trabalhava para a família Lemos Bastos, eu convivia lá, eles me arrumaram escola e tudo mais. Eu levava uns tapas da minha mãe. Levava beliscões e puxões de orelha [risos]. Sabe por quê? Às vezes, os patrões dela me convidavam para sentar à mesa com eles na hora de refeição e eu, inocente, aceitava. Daí, a minha mãe me dava uns tapas e dizia que não era para aceitar. Só que para eu entender isso criança... não tinha como! [risos] Eles me chamavam para ver televisão com eles, mas não era para aceitar! Como criança vou entender um negócio desses? Lógico que eu não ia entender. A gente tinha liberdade na casa. Morávamos na mesma casa, mas eu só vim entender essas coisas depois.

42Seu Dionísio fala do processo de construção de uma certa distância que era impossível para uma criança compreender. Aceitar o convite e sentar-se à mesa com os patrões era considerado por sua mãe “desrespeito”, sinal de que ele não conhecia o lugar que cabia a ele e a sua mãe naquela relação. Nota-se, nesse caso, a construção de uma alteridade que se elabora em detalhes mínimos para preservar a diferença ou distância entre patrões e empregados no interior dessa mesma casa.

43As narrativas dos moradores do Cantagalo e do Pavão-Pavãozinho descrevem diversas situações de segregação, diferenciação e de estigmatização sofridas por eles na relação com os moradores dos bairros de Ipanema e Copacabana. Nessas mesmas narrativas, sem qualquer referência à uma contradição no curso normal das coisas da vida, aparecem também situações de encontros fortuitos pelos bairros, que se desdobram em consultas médicas, empregos e, por vezes, em relações descritas como amizade entre moradores dos bairros e das favelas.

44O treinador de boxe Cláudio Coelho acima citado, após lembrar da estigmatização sofrida no início de sua carreira por ser morador de favela, segue sua narrativa e, de forma entusiasmada, enfatiza a relação com pessoas do asfalto que foram fundamentais, segundo ele, para a sua trajetória.

Na verdade, tudo isso começou porque quando eu tinha 16 anos, conheci um professor de judô que morava aqui na [rua] Antonio Parreiras, perto do hospital de Ipanema. Eu conheci ele no Arpoador, na praia de Ipanema. É porque todo mundo malhava no Arpoador, né? O nome dele chama-se Edgar Wallace. Aí a gente estava lá e começamos revezando na barra. Aí cada um fazia uma série e a gente começou a conversar. Ele contou que treinava judô e me convidou para começar a treinar também. Daí ele me deu o endereço dele de Ipanema e eu passei lá. Ele me deu um quimono e eu comecei a treinar. Aí você não sabe de uma! Quando eu cheguei em casa e contei para minha mãe, aí eu fui lá com a minha mãe na casa dele. Não é que minha mãe ficou lavando a roupa da família toda? Arrumou um emprego na época na família dele. E foi lá que eu conheci o meu professor de boxe, nessa academia de judô, que era aqui na [rua] Teixeira de Melo [Ipanema]. Foi assim que tudo começou! E por isso que eu acho que eu fico acreditando naquela coisa da solidariedade, que isso pode ajudar sim. Acho que é por isso que eu sempre acreditei nisso! Entendeu? É essa mistura favela-asfalto que eu tenho orgulho aqui no projeto!

45Ao narrar sua trajetória, ao mesmo tempo em que Cláudio ressalta o preconceito e estigmatização dos moradores do asfalto que, no início, atrapalhavam as suas aulas, ele também destaca a importância desse encontro com um morador de Ipanema, professor de judô, que o inseriu no mundo dos esportes. Foi através desse professor, que conheceu na praia, que Claudio começou a lutar judô e logo depois boxe, construindo sua prestigiosa carreira como treinador.

46Um importante encontro na rua de Copacabana aparece também na narrativa de Dona Alzelina, que destacou a falta de acesso das crianças das favelas às escolas públicas dos bairros em que se situavam. Com bastante orgulho, Dona Alzelina conta que o atual médico dela é um ex-aluno da escola onde ela trabalhava e com quem estabeleceu uma relação que ela nomeia como amizade:

O meu médico hoje, eu cuidei dele desde 6 anos na escola onde eu trabalhava. Ele era cadeira de rodas. Quer dizer, ele é até hoje! Só que hoje ele é o meu médico, amigo maravilhoso. Ele não é daqui de cima não [favela]. Ele morava na [rua] Souza Lima num apartamentão, agora mora lá na [rua] Francisco Otaviano também num apartamento enorme. A mãe dele ia levar ele na escola e ele era de cadeira de rodas. A sala dele ficava no segundo andar, então ficava ruim de subir com ele. Aí, eu treinei um jeito de subir com ele, que a mãe dele ficava boba como dava certo. Ai depois ele se formou. Um dia eu estava na rua com a Valdete, minha filha, e aí ele me encontrou. Nossa! Ele me abraçou me beijou e falou: “Ó, me formei e quando precisar, eu estou em tal endereço”. Ele é chefe lá no Hospital da Lagoa, mas ele me atende no consultório dele aqui na praça General Osório.

47Dona Alzelina e seu atual médico já se conheciam de longa data, mas foi a partir desse encontro na rua do bairro que retomaram contato. Em um contexto de difícil acesso à saúde pública no país, através desse encontro, ela passou a ser atendida por um médico particular de graça. É interessante destacar que a relação dos moradores das favelas com os bairros nunca foi tema de nenhuma pergunta feita aos moradores em entrevistas ou conversas informais. Ainda que o foco das entrevistas com esses antigos moradores fosse o processo de ocupação e formação dessas favelas, essas situações envolvendo o bairro e seus moradores apareceram com frequência em suas narrativas.

48Outro caso interessante para pensar como as trajetórias desses moradores das favelas e dos bairros, por vezes, se cruzam é o do próprio Juscelino, citado no início desse artigo. Em 1957, Juscelino e seus irmãos nasceram trigêmeos. Segundo conta ele, na época, o parto de sua mãe, em uma maternidade pública no bairro do Flamengo, virou notícia de jornal pela raridade do caso. A repercussão foi tamanha que ele e seus irmãos acabaram sendo apadrinhados pelo, então, presidente da República: Juscelino Kubitschek. Segundo conta Juscelino:

Aí meu pai teve uma mudança de vida porque fomos afilhados de ‘seu Juscelino’. Aí quem batizou foi dona Sara, a esposa dele. Nós nascemos no Fernando Figueira, maternidade que tem ali no Aterro do Flamengo. Nessa época, em 1957, trigêmeos era coisa rara de acontecer e houve todo aquele comentário. A pessoa que fez o parto da minha mãe era prima de seu Juscelino. Na ocasião, meu pai pedreiro, minha mãe trabalhando de lavadeira em casa de madame, aí teve aquele comentário todo e saímos na [revista] Manchete porque na época não existia Globo. Então, eles apadrinharam a gente e até os 12 anos a gente tinha convívio lá na casa dele, que era ali na praia. Ele tinha uma secretária, que apanhava a gente aqui na favela e levava lá para o seu Juscelino. A gente ficava com eles lá, passava o dia convivendo com ele. E isso foi até os 12 anos. Aí era assim, mas depois foi perdendo o contato.

49Juscelino conta com orgulho essa história aos fregueses de sua barraca na praia, destacando com ela a origem nobre do seu nome e a forma como a sua trajetória se cruzou, ainda que por um período limitado de tempo, com a do então presidente da República. Sendo trigêmeos, o nascimento de Juscelino ganhou destaque na mídia da época e, inesperadamente, ele e seus irmãos tornaram-se afilhados do presidente da República. Destaca-se aqui que os dois Juscelinos eram vizinhos no bairro de Ipanema, o que facilitava as visitas dos afilhados ao ilustre padrinho.

50Independente da qualidade e da duração dos vínculos estabelecidos, o material dessas entrevistas enfatiza os encontros fortuitos ou os cruzamentos de trajetórias de indivíduos, com condições socioeconômicas extremamente díspares, nas ruas dos bairros de Ipanema e de Copacabana, onde estão localizadas as favelas do Cantagalo e do Pavão-Pavãozinho. As narrativas desses antigos moradores dessas favelas destacam que eles transitam entre elas e as ruas desses bairros, estabelecendo relações de tipos variados com seus moradores e com o espaço.

Considerações finais

51As regras que organizam o espaço urbano são basicamente padrões de diferenciação social e de separação. Essas regras variam cultural e historicamente, revelando os princípios que estruturam a vida pública e indicam como os grupos sociais se inter-relacionam no espaço da cidade. Já no início do século XX, a forma como grupos distintos estavam organizados pelo território das cidades norte-americanas despertou o interesse de alguns autores da chamada Escola de Chicago. O estudo das relações de distância social e proximidade física entre distintos grupos no espaço urbano foi tema de alguns dos autores pioneiros da primeira geração dessa escola. Robert Park (1915), por exemplo, abordou a questão a partir do conceito de “região moral”, ao passo que Louis Wirth (1929) dedicou-se a analisar os guetos americanos.

52Mais tarde, William Foote Whyte (2005 [1943]) e Herbert J. Gans (1962) dedicaram-se a submeter as práticas sociais cotidianas de dois diferentes slums de Boston à análise etnográfica. Whyte (2005) etnografou as articulações ou arranjos entre organizações mafiosas e políticas que compunham um sistema de cooperação altamente organizado e integrado no North End, bairro de imigrantes italianos. Gans (1962), além de abordar temas importantes como pertencimento de grupo e reconhecimento social, narrou o processo de redevelopment (renovação urbana) do West End de Boston, cujo desfecho, no final da década de 1950, culminou na desocupação quase que total dessa área urbana. Tais autores ressaltaram a importância da rua e da vizinhança como lugar dos encontros, do estabelecimento de laços sociais e de práticas importantes para a vida urbana.

53A Escola de Chicago foi fortemente criticada, a partir do final da década de 1960, sobretudo por autores franceses, que argumentavam que o formato físico das cidades não é o resultado de processos espaciais naturais, mas sim das forças de mercado e do poder do governo. A perspectiva desses autores franceses para pensar as cidades colocava o foco da análise em questões distintas das priorizadas pela Escola de Chicago. As críticas ressaltavam que o formato físico das cidades deve ser pensado em termos da reprodução das desigualdades sociais e da atuação das forças de mercado e do poder do governo. Esses sociólogos franceses enfatizavam que o urbano deve ser compreendido, portanto, como espaço socialmente produzido, assumindo diferentes configurações, de acordo com os vários modos de organização socioeconômica e de controle político em que está inserido.

  • 9 A mais antiga tradução da Escola de Chicago na França é a do livro de Sutherland (1963) e, logo dep (...)

54Após duas décadas de predomínio das teorias estruturalistas e do materialismo histórico, a sociologia francesa passou a buscar outros instrumentos de análise para a compreensão dos problemas sociais que então se destacavam em sua sociedade: a imigração, a urbanização e as formas contemporâneas do pluralismo cultural. A introdução da Escola de Chicago na França deu-se, de forma lenta, a partir do fim da década de 1970 e faz parte dessa mudança gradual de paradigma nas ciências sociais.9 Mais marcadamente, a partir da década de 1990, autores franceses como Isaac Joseph partem em defesa da proposta da Escola de Chicago. Em defesa de Park, um dos grandes precursores da Escola de Chicago, Joseph (2005: 117) ressalta que:

Não se trata de integração, mas de livre circulação entre os territórios e os mundos, não se trata de assimilação das culturas, mas de sua porosidade. Essa ideia é central à sociologia da cidade tal como foi concebida por Park. Sem dúvida, uma ideia trazida por ele [...] e que o impede de reduzir a cidade a um mosaico de área naturais e de nichos ecológicos.

55As relações e vínculos estabelecidos entre os moradores das favelas do Cantagalo e Pavão-Pavãozinho e os bairros em que se localizam foram aqui pensadas também a partir da noção de citadino desenvolvida por Joseph (2005). Diferente do cidadão orientado por uma certa idealização política do espaço urbano, a figura do citadino remete àqueles que de fato circulam por universos heterogêneos, ocupando as ruas. Joseph destaca o espaço público como espaço de hibridização e de excentricidades, um espaço com vários mundos diferentes. Para o autor, o espaço público se caracteriza pela dispersão e o embaralhamento dos pertencimentos, sendo o espaço onde se pode observar como as formas de inserção social se conjugam com processos de socialização.

56Nas ciências sociais brasileiras, já na década de 1960, autores como, por exemplo, Silva (2011 [1967]) e Leeds e Leeds (1978), Kowarick (1979) promoveram críticas a uma visão dual da cidade, ressaltando que a população das favelas não deveria ser analisada como estando isolada. Tais autores destacavam que a população das favelas não poderia ser pensada como à parte ou separada da cidade, uma vez que estava inserida através de vários mercados, como, por exemplo, o de trabalho e o político. Já em 1967, Silva (2011 [1967]: 699) chamava a atenção para os perigos de se abordar a favela como algo que precisa ser integrado, pois essa percepção:

tende a ignorar ou reduzir a importância das íntimas vinculações entre a favela e o sistema global. A favela não é uma comunidade isolada: sua própria existência depende muito mais de determinadas condições estruturais da sociedade global do que dos mecanismos internos desenvolvidos para mantê-la.

57O autor ressalta, com isso, que a existência da favela está condicionada a estruturas mais amplas da sociedade em que se localiza. Também nesse sentido, analisando o modelo de crescimento e de urbanização das cidades brasileiras, Kowarick (1979) argumenta que, no Brasil, estabeleceu-se, via intervenção do Estado, um crescimento urbano segregador e excludente. O Estado atendia às necessidades do capital em matéria de infraestrutura e serviços urbanos, negligenciando às relativas à reprodução da força de trabalho. A inadimplência do poder público quanto ao ordenamento do crescimento urbano permitiu que o espaço das cidades fosse organizado ao sabor da especulação imobiliária. Esse seria o elemento fundamental na caracterização do que se denominou “padrão periférico de urbanização”. Com isso, Kowarick (ibidem) ressalta que não há crescimento desordenado em nossas cidades. Se assim fosse, as cidades brasileiras não apresentariam quase que invariavelmente o mesmo padrão de expansão territorial: concêntrico e baseado no alargamento de periferias sem infraestrutura urbana. Dessa forma, o autor destaca, então, o papel do Estado na formação e consolidação de suas margens.

58Silva (2011 [1967]) e Kowarick (1979), já nas décadas de 1960 e 1970, criticavam o padrão binário centro-periferia ou asfalto-favela, ressaltando que, historicamente, essas se integraram ou participaram da cidade, quase sempre numa relação assimétrica de poder. Desde então, o suposto “isolamento” das favelas e periferias vem sendo, portanto, discutido e criticado na academia, por não dialogar com o fato de que a distribuição socioespacial das cidades é, na realidade, muito mais complexa e perversa. Apesar das importantes críticas à concepção dualista realizadas, o mito da “cidade partida” sustenta o debate público e permeiatrabalhos acadêmicos ainda nos dias de hoje.

59Segundo Ribeiro e Lago (2001), a inclusão do narcotráfico e da violência urbana na agenda da academia reforça a legitimidade da concepção dualista, uma vez que a vida organizativa da favela estaria sendo substituída por um estado de anomia. Não raro encontramos menções que associam as favelas cariocas aos guetos negros americanos, bem como sendo pensadas como outro mundo social à parte da cidade dita formal, que teria regras próprias e onde o Estado estaria ausente.

60Apesar desses trabalhos terem tido uma certa audiência intelectual, não foram suficientes, como destaca Valladares (2005), para atingir as representações que estruturavam o imaginário coletivo das elites e transformar as políticas públicas. Muitas foram e são as representações sobre as favelas cariocas que orientam a ação do poder público sobre as mesmas. Ao longo da história, as percepções sobre elas alternaram-se e sobrepuseram-se entre problema sanitário, de ordem pública, estético, habitacional, de segurança ou social. A representação que aqui nos interessa é a que orienta ações antigas, mas também atuais, do poder público sobre elas: a de seu suposto isolamento.

61A representação das favelas como isoladas ou à parte da cidade orientou e ainda orienta as ações do poder público no sentido de promover a sua “integração” à “comunidade nacional” e à “cidade formal”. É importante destacar que disfarçada sob o discurso da “integração” está a relação, desde sempre existente, entre a favela e a cidade, que, inclusive, é condição de sua própria existência. Nas análises acadêmicas, a chave de leitura da exclusão tornou-se, frequentemente, utilizada por quase todos os estudos de pobreza e, por extensão, pelos estudos realizados sobre as favelas ou centrados nos seus habitantes. Como destaca Valladares (2005), as favelas adquirem uma nova dinâmica social, caracterizada em particular pelo papel crescente do tráfico de drogas, inclusive no financiamento dos serviços locais, no domínio das associações de moradores e na vida local. Nesta representação, as favelas passam a ser consideradas como o lugar por excelência da exclusão social moderna. As ideias de fragmentação social, de fratura social tornaram-se dominantes nessa nova dinâmica intelectual em que a participação de Ongs, e de suas pesquisas, colabora para aproximar as noções de exclusão social e de cidadania parcial ou incompleta.

62O discurso da “chegada do Estado”, quando da instalação das UPP em favelas da cidade do Rio de Janeiro, dialoga de forma absolutamente clara com essa representação das favelas como isoladas, vivendo em um mundo à parte, onde o Estado estaria ausente. Pensada na chave da exclusão, a favela teria uma economia própria, leis intramuros e códigos particulares, desenvolvidos nesses espaços entregues à própria sorte e abandonados pelos poderes públicos.

63Cavalcanti (2013) destaca que a forma como o PAC opera a inscrição das favelas na paisagem da cidade é o seu principal diferencial em relação às políticas anteriores. A autora analisa alguns desses símbolos do propalado discurso de integração entre favela e asfalto inscritos pelo PAC na paisagem da cidade, ressaltando que aquilo que salta aos olhos nas obras do PAC não é a favela em si mesma, mas o “espetáculo de sua ‘integração’ à cidade”. Assim, ganham destaque nessas obras os elevadores, teleféricos e passarelas que ligam a favela e o asfalto.

64No material empírico apresentado nesse artigo, as narrativas evidenciam que as mães do Juscelino, do Seu Dionísio e do Cláudio Coelho, por exemplo, trabalhavam como empregadas domésticas ou lavavam roupa nas casas dos moradores dos bairros de Ipanema e Copacabana. Dona Azelina trabalhou a vida inteira em uma escola pública do bairro de Copacabana. Juscelino trabalha numa barraca de praia, vendendo bebidas, em sua maioria, a moradores do bairro. Seu Dionísio, importante liderança política local, já foi candidato a vereador e atua na vida política da cidade desde a década de 1980. Além dos vínculos trabalhistas, através dos quais esses moradores de favelas se integram economicamente, por meio de relações assimétricas, ao bairro e à cidade em geral, há ainda a circulação e encontros furtuitos nos espaços públicos em que coabitam.

65Nesse sentido, a fala de Seu Dionísio, morador do Pavão-Pavãozinho, sobre as obras do PAC, ajuda e pensar:

Essa coisa de integração que eles falam agora como novidade toda hora é besteira. Aqui sempre teve o relacionamento de serviço. Sempre teve integração da convivência. As pessoas mulheres aqui trabalhavam aonde? Nos apartamentos! Nas casas deles lá em baixo! Se a mão de obra é explorada, se foi bem paga ou não, é outro assunto de luta, mas sempre existiu essa relação.

  • 10 Mais sobre a ocupação de espaços públicos e privatizados pelas classes populares, médias e elite em (...)

66As favelas do Cantagalo e do Pavão-Pavãozinho estão presentes em Ipanema e Copacabana desde o início do surgimento destes bairros, no início do século XX. Tendo desde sempre convivido pelo espaço público do bairro, a relação estabelecida entre moradores do asfalto e da favela apresenta características que contrastam fortemente, por exemplo, com as dos “enclaves fortificados” da cidade de São Paulo, descritos por Caldeira (2000). Segundo a autora, até a década de 1980, a cidade de São Paulo era mapeada em torno da oposição centro-rico vs. periferia-pobre. É somente a partir dessa década, segundo Caldeira (ibidem), que pobres passam a residir em favelas nos bairros valorizados da cidade, não permitindo mais que se ignore as diferenças de classes. É nesse momento que surgem os “enclaves fortificados”, que seriam os espaços privatizados e monitorados para residência, consumo e lazer. Nesse caso, a esfera pública tradicional das ruas de São Paulo foi abandonada pelos ricos para os pobres e marginalizados (ibidem).10

67Nos bairros de Ipanema e Copacabana, na cidade do Rio de Janeiro, os espaços públicos, como as ruas e praias, não foram completamente abandonados pelos moradores ricos que se isolaram em condomínios fechados, por exemplo, nos bairros da Barra da Tijuca e do Recreio. Os moradores desses bairros de classe média e alta convivem com a existência dessas favelas ali desde o princípio do surgimento desses bairros, não sendo as favelas para eles uma novidade, dado que cresceram juntas com esses bairros. Isso não significa dizer, em hipótese alguma, que esses espaços são democráticos e que ser morador da favela ou do asfalto não orienta a forma como esses espaços são por eles ocupados e frequentados.

68Buscou-se aqui pensar essas favelas e as trajetórias de alguns de seus moradores em seus entrecruzamentos com o bairro, a cidade e o Estado. Como destaca Telles (2010: 165):

Não se trata, é bom desde logo evitar a confusão, de algo que acontece às margens, em algum lado de fora, do “lado de lá”. Muitíssimo diferente disso: é um mundo que não está fora, porém no centro mesmo da vida urbana, que vem sendo tecido em torno das dimensões estruturantes da vida social e que ganha forma nos acontecimentos prosaicos do dia a dia.

69Sem deixar de perceber e pensar o espaço em questão como uma resultante de relações político-econômicas, pretendeu-se aqui aproveitar as contribuições metodológicas de Chicago, descrevendo e analisando não apenas a segregação, mas também a circulação e a interação face-a-face dos encontros entre esses diferentes atores pelo espaço público desses bairros. Ao descrever e analisar esses encontros pelas ruas dos bairros e as relações estabelecidas entre moradores da favela e do asfalto, busquei não apenas reforçar sua existência, por vezes oculta sob a máxima da “cidade partida”; mas, sobretudo mostrar com maiores detalhes a complexidade que as perpassa.

70As pesquisas baseadas em hipóteses dualistas não dão suficiente atenção aos fenômenos de hibridação das formas e culturas urbanas, que ligam a economia dos bairros abastados às favelas. Além de mostrar como os grupos estão distribuídos e segregados pelo espaço da cidade, parece ser de fundamental importância observar os encontros e circulação dos atores por mundos diversos, onde na interação social geram alteridade e distância social, mas sem perder de vista os vínculos estruturais que os relacionam. Conforme nos lembra Gupta e Ferguson (2000: 41), é interessante pensar “os processos de produção da diferença em um mundo de espaços cultural, social e economicamente interdependentes e interligados”. Mais do que etnografar enclaves, separação e segregação, o material empírico deste trabalho faz pensar na importância de explorar a produção da diferença dentro de espaços comuns, compartilhados e conectados, enfatizando as relações estruturais entre esses mundos.

Como as transformações no espaço geográfico tem lados positivos e negativos?

Como pontos positivos podemos destacar: o surgimento e desenvolvimento das cidades, residências, escolas, eletricidade, saneamento básico, geração de empregos e renda. Os pontos negativos ocorrem pelo excesso, pela não consciência e bom sendo do homem ao agir sobre o meio em que vive.

Como você imagina o bairro de Copacabana?

Polo turístico cultural e hoteleiro Talvez por causa desse grande destaque aos eventos, Copacabana se tornou um grande polo turístico. O bairro é repleto de restaurantes, bares, cafés, cinemas, teatros, bancos, igrejas, sítios históricos, entre outras coisas. São muitas atrações que podem ser vivenciadas no local.

Qual das imagens melhor representa a Praia de Copacabana retratada na declaração de Fernando Polônia?

Todavia, a declaração emblemática de Fernando Polônia ressalta a época de Copacabana na imagem 2, por conta da beleza mais visual e evidente, período em que haviam poucas construções e edificações, momento em que a paisagem era mais nítida e bela.

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