Quem pode propor arguição de descumprimento de preceito fundamental?

A ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) é uma ação de controle concentrado de constitucionalidade trazida pela Constituição Federal de 1988. A ação tem como finalidade o combate a atos desrespeitosos aos chamados preceitos fundamentais da Constituição.

Neste conteúdo, além de entendermos a complexidade da ADPF, conceituaremos os preceitos fundamentais, a importância dessa ação de controle de constitucionalidade, quem são os legitimados, quando pode ser utilizada e quais seus efeitos.

Como extra, também traremos três exemplos de ADPF que entraram para a história do Brasil.

O que é ADPF? 

A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, ou ADPF, é uma ação de controle concentrado de constitucionalidade trazida pela Constituição Federal de 1988. Sendo assim, é uma ação que tem como finalidade o combate a quaisquer atos desrespeitosos aos chamados preceitos fundamentais da Constituição. 

Assim, ela acaba sendo uma ação de natureza residual, ou seja, pode ser utilizada para combater, reaver ou evitar quaisquer ofensas ao conteúdo da Carta Magna

O que é preceito fundamental?

A princípio, pode causar uma certa confusão entender o que são os preceitos fundamentais a serem defendidos por meio de uma ação tão específica e essencialmente residual. 

Ora, não seria todo o conteúdo da Constituição por si fundamental? É verdade que sim. No entanto, aqueles valores intrinsecamente conectados aos valores mais profundos da sociedade como um todo são os que chamamos de preceitos fundamentais. 

Portanto, preceitos fundamentais são aqueles que exercem a função, ou possuem o valor, de alicerçar a ordem jurídica do Estado

Contudo, não podemos confundir preceitos fundamentais e princípios fundamentais. Os preceitos, que estamos discutindo neste artigo, possuem uma abrangência conceitual maior do que os princípios

Importa destacar que não há na Constituição e nem em lei algum rol taxativo indicando quais seriam esses preceitos, por isso, o Supremo Tribunal Federal entendeu que cabe à parte autora demonstrar no caso em concreto. 

O caráter subsidiário da Lei nº 9.882/99

O caráter de subsidiariedade é um dos fatores principais de importância do surgimento da Lei da ADPF, mas não somente isso. A lei surgiu 11 anos após a promulgação da Constituição Federal, e podemos perceber que, no meio das relevantes alterações sofridas pelo sistema de controle de constitucionalidade nesse tempo, havia uma lacuna. 

Portanto, um ponto que deve ser destacado e bem compreendido quando falamos da ADPF é o seu caráter de subsidiariedade

Segundo a Lei 9.882/99, que dispõe sobre o julgamento desse tipo de ação, não será admitida ADPF quando houver outro meio eficaz de sanar a lesividade. Por isso é muito importante que o advogado entenda bem seu conceito, sua finalidade, quem são os legitimados e quais seus efeitos. 

Houve o desenvolvimento da Ação Direta de Inconstitucionalidade e criação da Ação Declaratória de Constitucionalidade que, como sabemos, têm seus específicos cabimentos no âmbito do controle concentrado. Via-se uma lacuna no que dizia respeito àquilo que fosse suscetível ao controle difuso, por exemplo. 

Então, a lei veio para melhor efetivar esse instrumento constitucional, que é bastante singular e estava há mais de uma década desvalorizado no ordenamento jurídico. 

Quais são os legitimados para propor uma ADPF?

Segundo o que preconiza o artigo segundo da lei da ADPF, os legitimados para propor esse tipo de ação são os mesmos que podem propor a Ação Direta de Inconstitucionalidade e Ação Declaratória de Constitucionalidade, previstos no artigo 103 da Constituição Federal. São eles:

art. 103, CF:
I – o Presidente da República;
II – a Mesa do Senado Federal;
III – a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV – a Mesa de Assembléia Legislativa ou a Mesa da Câmara Legislativa do DF;
V – o Governador de Estado ou o Governador do Distrito Federal;
VI – o Procurador-Geral da República;
VII – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII – partido político com representação no Congresso Nacional;
IX – Confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.”

Vale destacar que o Supremo Tribunal entende que os legitimados para propor ADPF dividem-se entre legitimados especiais e universais. Os legitimados especiais são A Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal, o Governador de Estado ou do Distrito Federal e a confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional (incisos IV, V e IX do artigo 103).

Já os legitimados universais são os demais elencados no mesmo dispositivo jurídico. 

É muito importante saber essa diferença entre os legitimados especiais e os universais. Isso porque há um entendimento de que os legitimados especiais devem demonstrar que existe pertinência temática entre o que propõem na ADPF e o que defendem institucionalmente.

Como a ADPF possui caráter de subsidiariedade, ela só é cabível quando não há outro meio para sanar a lesividade a um preceito fundamental

Há duas correntes que discutem o exaurimento de mecanismos para sanar a lesão: a restritiva e a ampliativa.

Para a restritiva, a subsidiariedade abarca a impossibilidade de qualquer meio processual existente; enquanto a ampliativa defende que abrange apenas a ineficácia dos mecanismos do controle concentrado, a ADI e a ADC. 

Quais são os efeitos da decisão na ADPF?

Segundo a Lei da ADPF aduz que a decisão terá eficácia erga omnes, ou seja, contra todos, e efeito vinculante relativamente aos órgãos do Poder Público. A lei também prevê que sua decisão será ex tunc, ou melhor dizendo, possui caráter retroativo. 

Desse modo, por medidas de segurança jurídica e de excepcional interesse social, pode o STF modular os efeitos da decisão, podendo fazê-lo de maneira subjetiva, limitando a eficácia erga omnes, e temporal, mitigando a retroatividade da decisão. 

É importante destacar que, caso ocorra a modulação temporal, ela poderá ser restrita, prospectiva ou pro futuro. 

Restrita

Sendo restrita, ela exclui a retroatividade de um tempo determinado anterior ao processo. 

Prospectiva

A prospectiva origina declaração ex nunc. Ou seja, sua aplicação se inicia a partir do momento de sua criação.

Pro futuro

Pro futuro determina que os efeitos sejam produzidos posteriormente à sentença. 

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Casos históricos de ADPF no Brasil

Confira agora três casos de ADPF que entraram para a história no Brasil: 54, 347 e 130.

ADPF 54 

Bastante conhecida e polêmica, a ADPF 54 foi proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores (CNTS). O caso envolvia uma gestante que pediu autorização judicial para abortar após diagnóstico de anencefalia do filho, mas teve o pedido negado pelo juiz. 

Depois de ter recebido várias negativas no decurso processual, a autora teve seu pedido deferido pelo STF quando já tinha dado à luz. 

Assim, ao tomar conhecimento da ação e em defesa da não criminalização dos profissionais de saúde que trabalhem provocando abortamentos em razão de diagnósticos de anencefalia, a CNTS propôs a ADPF em 2004, sendo julgada 8 anos depois, com 8 votos a favor e 2 contra. 

Nessa decisão histórica, o STF entendeu que um feto anencéfalo não seria juridicamente vivo, em que pese ser biologicamente. Portanto, para o STF, o abortamento nesses casos não configura crime contra a vida. 

ADPF 347 

Ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e julgada em 2015, a ADPF 347 reconheceu o “estado de coisas inconstitucional” do sistema carcerário brasileiro. 

O partido defendeu a tese que o sistema precário dos presídios causavam violência contínua e ferimento aos direitos humanos dos presidiários. O STF, então, determinou a realização de audiências de custódia em todo o Brasil. 

Além disso, foi determinado que a União liberasse as verbas do Fundo Penitenciário Nacional de forma imediata. 

ADPF 130 

A ADPF 130 trata de mais um importante avanço em defesa do Estado Democrático de Direito. 

Ela surgiu com o objetivo de revogar a Lei de imprensa, nascida antes da promulgação da Constituição de 88, e continha dispositivos que não foram recepcionados pela Constituição. 

Portanto, entendeu-se que a lei atenta contra o direito fundamental da liberdade de imprensa e a liberdade de expressão por trazer penalidades que incluíam inclusive a prisão de jornalistas.

Conclusão 

Como vimos aqui, a ADPF é uma ação do controle concentrado de constitucionalidade trazida pela Carta Constitucional em 1988, que nasceu com o objetivo de combater qualquer ferimento ao que for conhecido como “preceito fundamental”. 

Não devemos confundir preceito com princípio, pois os preceitos fundamentais têm uma abrangência maior para a sociedade.

Então, surgida apenas 11 após a Constituição Federal, a lei da ADPF trata do seu caráter subsidiário, determinando que ela seja utilizada apenas quando não for possível uma ADC ou ADI, embora tenham os mesmos legitimados para sua propositura. 

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Quando é cabível a arguição de descumprimento de preceito fundamental?

1º da Lei 9.882/1999 previu um modelo de arguição que pode ser considerado como um tipo de incidente de descumprimento de preceito fundamental: “Caberá também arguição de descumprimento de preceito fundamental: I – quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, ...

Quem é o legitimado passivo da ADPF?

Já os legitimados passivos da ADPF são as autoridades, órgãos ou entidades responsáveis pela prática do ato questionado ou pela omissão impugnada.

Em quais situações a ADPF pode ser utilizada?

A ADPF não pode ser usada para questionar a constitucionalidade de lei, exceto as municipais ou anteriores à Constituição de 1988. Pode ser proposta pelos mesmos legitimados a ajuizar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (veja Ação Direta de Inconstitucionalidade).

Quem tem legitimidade para propor uma ADI?

Como legitimados interessados ou especiais – a) Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal, b) o Governador de Estado ou do Distrito Federal, c) confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

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