Novos termos, como “definhamento” e “fadiga pandêmica”, ajudam a explicar o momento atual. Confira dicas e estratégias de enfrentamento e cuidado Show Publicado em 10/10/2021 11h45 Atualizado em 01/11/2022 10h43 Nunca se falou tanto em saúde mental. Antes mesmo de a pandemia se tornar parte da vida de praticamente toda a população do planeta, os números já eram alarmantes. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a ansiedade afeta 18,6 milhões de brasileiros e os transtornos mentais são responsáveis por mais de um terço do número de pessoas incapacitadas nas Américas. A Covid-19 fez não só com que esses transtornos se agravassem, mas também trouxe novas questões. Na tentativa de entender o contexto, especialistas criaram termos para dar nome aos sentimentos e ao estado psíquico que muita gente tem vivenciado. Fadiga pandêmica, por exemplo, é a terminologia adotada pela OMS para designar o cansaço e o esgotamento físico e mental provocados pela pandemia. As restrições na vida social, financeira, entre outras dimensões, aumentam a falta de perspectiva e diminuem o poder de planejamento. Nada disso é, em si, um sério transtorno psíquico, mas esse tipo de sofrimento prolongado pode, segundo a organização, gerar ansiedade, depressão e insônia, mesmo em quem não apresentava qualquer tendência prévia. Como identificar fadiga pandêmcia: Especialista do HC-UFPE explica o que é a fadiga pandêmica Outra expressão que ganhou popularidade foi o definhamento (“languishing”, no termo original, em inglês), criada pelo psicólogo inglês Adam Grant. Os sintomas mais comuns são: estagnação, falta de propósito e de motivação, dificuldade de concentração e queda de rendimento no trabalho. Para ele, essa falta de alegria e de objetivos, ou seja, o vazio, está entre o bem-estar e a depressão. Em outras palavras, não há uma doença mental instalada, mas tampouco indicativos de boa saúde. Dialogando com o conceito de fadiga pandêmica, o definhamento também é um sinal de alerta, pois pode se transformar em depressão e ansiedade no futuro, de acordo com o criador. O que dizem os especialistas Para o coordenador-geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do Ministério da Saúde, Rafael Bernardon, por um lado, trata-se de “novos termos para questões antigas”. “Estresse agudo, crônico e pós-traumático e síndrome de burnout, por exemplo, são fenômenos conhecidos. E a pandemia é uma grande causadora desses episódios”, explica. Por outro lado, o psiquiatra reconhece que a pandemia de covid-19 é inédita no mundo globalizado, afeta todos os países e produz novas necessidades de adaptação. Nesse cenário, a adoção dessas nomenclaturas pode ajudar a entender particularidades que vão além dos transtornos conhecidos. A psicóloga Miriam Trudo concorda com os novos termos e diz que reconhece todos os sintomas mencionados nos pacientes que atende - em sua maioria, crianças e adolescentes - e que o reflexo disso ainda será entendido e sentido por muito tempo. “A pandemia nos tirou muitas coisas, mas principalmente nos roubou a rotina, e sem previsão de retorno”, pontua. Questões recorrentes A desesperança é um dos sentimentos mais presentes nos atendimentos feitos por Miriam, e impacta o humor e a disposição. “É muito significativo ter tantos jovens sem perspectiva, deixando de fazer projetos futuros”, lamenta a psicóloga. Outra emoção recorrente é o medo, que, segundo a profissional, é um dos sentimentos mais importantes do ser humano, pois induz a autopreservação, mas apenas quando não está em níveis alarmantes. “O medo deixou de preservar para paralisar, é um medo patológico, e impede os pacientes de realizar”, explica. Na prática, a pandemia acabou intensificando os quadros de ansiedade e depressão e desestabilizando doenças pré-existentes que estavam controladas. Além disso, novos casos proliferaram e a busca por tratamento aumentou. “E o número de pessoas com questões psicológicas provavelmente é muito maior, pois muitos não buscam ajuda”, comenta. Entre os elementos novos que entraram na equação por meio da covid-19 está o peso do luto, pois algumas famílias perderam muitos membros, por vezes mais de uma pessoa ao mesmo tempo, sem a possibilidade de velar o corpo com os entes queridos. Outro ponto importante é o impacto profundo na interação social. “As pessoas reagem de maneiras diferentes ao distanciamento, mas, via de regra, somos todos animais sociais”, pondera Rafael Bernardon. “Agora estamos começando a flexibilizar a convivência nos círculos mais íntimos, mas seguimos vivendo com restrições junto aos contatos expandidos, nesse ‘novo normal’ em que temos que reiventar essas relações”, diz. Nesse contexto, a internet ganhou ainda mais importância como uma solução para estar próximo de familiares e amigos, mesmo estando longe. Porém, o uso excessivo dos meios online também teve consequências. “Redes sociais podem ser grandes armadilhas, pois trazem muito a ideia de comparação e um imediatismo que não cabe na vida offline, que não ocorre na mesma velocidade. Tudo isso pode gerar frustrações, estresse e sofrimento crônico”, pondera o coordenador, que também lembra da “enxurrada de informações”, entre elas as notícias falsas, às quais as pessoas estão expostas, outra grande fonte de ansiedade. E não é só o ambiente da pandemia que causa alterações na saúde mental, mas a própria doença também. Alguns estudos mostram que cerca de 30% das pessoas que tiveram covid-19 vão desenvolver algum sintoma psiquiátrico, como lembra Bernardon. “A covid-19 é uma doença nova, e muito ainda está sendo pesquisado. Mas já sabemos que há pessoas desenvolvendo sintomas que não tinham antes, como distúrbios do humor, ansiedade, indisposição (fadiga crônica), problemas de memória e dores crônicas. Inclusive, pedimos que as pessoas com esses sintomas residuais procurem o SUS, para que a gente entenda melhor esses quadros e ofereça assistência”, convida. Estratégias Miriam Trudo ressalta a importância do Sistema Único de Saúde (SUS), especialmente no atual contexto, alinhada a outras políticas públicas que impactam direta ou indiretamente na saúde mental, como o acesso à boa alimentação e a empregos. “Muitas famílias sofreram impactos econômicos decorrentes da pandemia, e as condições externas também influenciam na recuperação”, afirma. Ela também pede que as famílias fiquem atentas a sinais e que apoiem os filhos na busca por cuidados de saúde mental. “Tem adolescentes que chegam aqui dizendo que o pai acha que psicólogo é coisa de louco e é melhor ir lavar a louça, sendo que estamos falando de questões muito delicadas, que podem ter consequências sérias e irreversíveis”, alerta. Confira, abaixo, as dicas dos entrevistados:
Conheça aqui os serviços do SUS para assistência à saúde mental: setembro amarelo. Laísa Queiroz Como a pandemia está afetando a saúde mental?Dentre elas, pode-se destacar a ação direta do vírus da Covid-19 no sistema nervoso central, as experiências traumáticas associadas à infeção ou à morte de pessoas próximas, o estresse induzido pela mudança na rotina devido às medidas de distanciamento social ou pelas consequências econômicas, na rotina de trabalho ou ...
Quais os impactos da pandemia na sua vida?A pandemia trouxe uma grande insegurança e questionamentos para a população. Buscas sobre transtornos mentais na internet bateram recorde. Os números em 2020 apresentaram uma alta de 98% se comparados aos últimos dez anos, segundo dados fornecidos pelo Google ao jornal O Estado de S.
O que pode afetar a saúde mental?Estresse, genética, nutrição, infecções perinatais e exposição a perigos ambientais também são fatores que contribuem para os transtornos mentais.
O que a pandemia trouxe para as pessoas?A estimativa de infectados e mortos concorre diretamente com o impacto sobre os sistemas de saúde, com a exposição de populações e grupos vulneráveis, a sustentação econômica do sistema financeiro e da população, a saúde mental das pessoas em tempos de confinamento e temor pelo risco de adoecimento e morte, acesso a ...
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