Quais são as principais fases do processo de ocupação da Amazônia?

A HISTÓRIA da expansão territorial do Brasil ainda tem sido pouco pesquisada por nossa historiografia, apesar da importância estratégica e atual que reveste a questão. Entretanto, historiadores amazonenses, como Arthur Cézar Ferreira Reis, ex-governador do Amazonas, e Samuel Belchimor, contribuíram com relevantes obras para o conhecimento da história da ocupação e formação das fronteiras da região. Também a obra documental e os relevantes estudos legados pelo historiador português Jaime Cortesão estão a merecer renovada atenção da parte de historiadores e cientistas políticos brasileiros, se quisermos nos preparar melhor no necessário conhecimento da formação de nossas fronteiras.

Em decorrência, os equívocos com os quais se defronta o conhecimento da realidade amazônica decorrem da carência de ensinamentos geopolíticos mais sólidos, embasados em uma historiografia mais rigorosa acerca da legitimidade da ocupação portuguesa dos territórios amazônicos, que abrangeram no passado o estado do Maranhão e Grão-Pará. A maioria das contribuições existentes datam dos anos 1950-60 e hoje são pouco conhecidas. É o caso das obras fundamentais de Arthur César Ferreira Reis e de Jaime Cortesão. Por outro lado, os estudos recentes se prendem a questões como a denúncia dos latifúndios da região ou a necessária defesa ecológica da floresta e seus recursos, inclusive minerais, desconhecendo as origens da ocupação, da posse e dos direitos coloniais que nortearam as conquistas do Brasil português.

Desde 1974, ao iniciar as primeiras investigações acerca das missões jesuítas, eu me convencera da importância dos fundamentos geográficos e contingenciamentos das condições do habitat sobre os povos, consolidada pela leitura das obras de Jaime Cortesão, em especial Raposo Tavares e a formação territorial do Brasil (1966). A obra se inicia com um fundamental capítulo acerca da geografia e etnografia da América do Sul, em que o autor desenvolve a tese de que a posição e o espaço em que hoje se assenta o Estado brasileiro se explicam um pelo outro. Ou seja, posição e espaço facilitaram a ocupação territorial do país e, dessa forma, beneficiaram a ocupação da hinterlândia brasileira pelos portugueses, ainda no século XVI, posse que já estaria consolidada no século XVIII. Escreve Cortesão:

Um dos mais extraordinários conjuntos hidrográficos do planeta, moldado sobre o relevo do continente e abrangendo a mais vasta unidade vegetal das Américas, envolve a área da floresta tropical num imenso arco e sistema de circulação fluvial. [...] Essa coordenação lógica, de tão grande importância na formação geográfica e orgânica do Brasil, avulta logicamente, quando sobrepomos ao mapa orográfico geral da América do Sul e o das suas grandes formações vegetais (Cortesão, 1966: 19).

O relevo e a hidrografia existentes do lado do território brasileiro contrastam com a verdadeira fronteira representada pelos contrafortes da cordilheira andina, que corta os domínios meridionais da América espanhola. Cortesão lembra a importância repressora dessa muralha, que foi um dos grandes obstáculos à penetração dos espanhóis na Amazônia. Sem falar na descoberta fundamental da prata de Potosi, que influenciou as decisões políticas imperiais dos monarcas espanhóis, levando-os a impedir qualquer abertura de caminho que pudesse interferir no rígido controle do contrabando e seus possíveis desvios, exercido pela Coroa sobre os caminhos que conduziam a prata americana para a Espanha (Gadelha, 1980: 135-49).

Em contraposição, porém, as medidas políticas adotadas contrariavam a realidade geográfica, pois para o leste, e em toda a extensão norte-sul, o relevo e a hidrografia do continente beneficiavam a expansão portuguesa. De fato, ao norte e ao sul se estendem as cabeceiras e os afluentes das duas maiores bacias fluviais quiçá do planeta, a amazônica e a platina, que correm relativamente paralelas em direção ao Atlântico e em direção contrária ao Pacífico. Essas bacias teriam sido responsáveis pela relativa facilidade com que se deu o deslocamento e integração dos homens ao espaço, e deste ao estado português. É sabido, afirma Cortesão, que antes mesmo da chegada dos europeus, os índios e, depois, os bandeirantes e sertanistas, mamelucos e portugueses que partiam de vários pontos do território vararam por terra e canoas de um rio a outro, na região comum das respectivas vertentes dos afluentes formadores dos rios Amazonas e Prata.

Sobre esse espaço continental, situado nos trópicos úmidos e rodeado insularmente pelo sistema hidrográfico platino-amazônico, de traços muito vigorosos, destacavam-se, envolvendo-o num arco de círculo irregular, certas zonas de relevo áspero, declive abrupto ou profunda depressão, que opunham forte obstáculo à expansão humana e que chamaremos faixas ou centros formadores de fronteira (Cortesão, 1966: 21).

A unidade geográfica compreendia outra, ainda mais sólida: a unidade cultural da ocupação humana, composta por povos largamente diferenciados daqueles contidos pela cordilheira andina e representados pelas civilizações maia-incáica, que todavia nunca excederam as bordas da floresta tropical equatoriana, venezuelana e boliviana. Porém, do outro lado da cordilheira, adentrando os limites da floresta tropical, os grupos humanos eram outros, conforme demonstrado pelos trabalhos do antropólogo francês Alfred Métraux, ao analisar o extenso movimento migratório dos povos pré-colombianos (aruak, karib, tupi, guarani, jê e outros), que dominavam e controlavam o território da América do Sul, desde o Orinoco até o Prata, ocupando não somente o interior das terras como ainda a vasta extensão do litoral atlântico português (Métraux, 1927).

Regulava o Tratado de Tordesilhas, desde 1494, a partilha entre Espanha e Portugal das terras divididas do Atlântico. Esse tratado foi a verdadeira base em que se fundamentaram os tratados de fronteiras do século XVIII, entre os quais Utrecht, Santo Ildefonso e Madri.

As negociações entre Portugal e Espanha, que culminaram em Tordesilhas, se haviam iniciado desde a chegada do almirante Cristóvão Colombo a Sevilha, de retorno de sua viagem de descobrimento das terras americanas. Com avanços e recuos, as negociações levaram cerca de um ano e meio, obtendo os embaixadores portugueses, em 7 de junho de 1494, a assinatura do tratado, após haverem recusado veementemente aceitar as bulas anteriores outorgadas por Alexandre VI, que favoreciam os reis católicos de Espanha. (Cortesão, 1956: I, l-lxxii).

Em sua brilhante introdução ao primeiro volume de Pauliceae lusitana monumenta historica, Jaime Cortesão indica que, à época dessas negociações, dentre todos os povos da Europa somente os portugueses tinham condição de possuir idéia aproximada sobre a localização geográfica mais correta da Índia, objetivo de Cristóvão Colombo. Relata e documenta os artifícios diplomáticos desenvolvidos por D. João II, verdadeiro jogo de diplomacia e astúcia visando obter o que considerava ser um direito já adquirido por Portugal, pois embora os soberanos de Espanha estivessem protegidos pelo papa espanhol, ele e seus ministros se encontravam escudados em maior e certo conhecimento experimental da estrutura geral do globo terrestre. Conhecimentos que foram lentamente adquiridos pelos pilotos portugueses, através de mais de cinquenta anos de experiências náuticas anteriores a Colombo (Cortesão, 1956: vii-x) (1 1 Esses conhecimentos permitiram ao navegador e cosmógrafo português Duarte Pacheco, que foi um dos negociadores de Tordesilhas, calcular o valor do grau terrestre em 18 léguas, ou seja, em 106,56 km, com erro de apenas 4% em relação ao valor atual conhecido de 111 km. Porém, Cristóvão Colombo calculara esse valor em 56 milhas (pouco mais de 14 léguas), ou seja, em menos de 84 km. Duarte Pacheco errou por 4,5 km, escreve Cortesão, mas Colombo por mais de 27 km (Cortesão, 1956: I, ix). 2 Segundo cálculos realizados nos anos 40 pelo matemático historiador Gago Coutinho, o meridiano de Tordesilhas, contado sobre o paralelo desde a ponta mais ocidental da ilha de Santo Antão e aceitando o valor corrente desse grau à época (17,5 léguas), passaria a 37º 30' de longitude oeste, cortando o Brasil pela baía de Maracanã, ao norte, e cerca de Iguape, ao sul. A demarcação das Molucas só se deu em 1529, pelo Tratado de Saragosa, firmado entre D. João III e Carlos V. Os textos dos Tratados de Tordesilhas e de Saragosa foram publicados em Cortesão, Pauliceae lusitana monumenta historica, v. 1. 3 Esta opinião é também defendida por Arthur Cézar Ferreira Reis. 4 Doc. 107 em Pauliceae lusitana, v. 1. partes 5-8, pp. 437-512, especialmente p. 443. Trata-se, sem dúvida, da expedição de Diego de Ordas, que recebera autorização do rei de Espanha para explorar o litoral norte até o Maranhão (Southey: I, 101-2). 5 Carvajal, 1941: 11-79. Em reconhecimento por esse serviço, Francisco de Orellana requereu e recebeu do rei de Castela o título de adelantado das terras do Amazonas, denominadas por ele "Nova Andaluzia" (1544), organizando a primeira tentativa de colonização. 6 Varnhagen foi o primeiro autor a publicar esse documento. Cópia do texto anotado por Carlos Drumond foi publicada na Revista de História, São Paulo: USP, jan./mar., 1950, 1, 95-102). Cortesão, no entanto, indica discrepância entre o documento original, que publica, e o texto de Varnhagen, também anotado por Drumond. 7 Segundo Cortesão, apenas em 1618 novo documento indicaria maiores conhecimentos geográficos acerca do rio Amazonas. Trata-se do Memorial de Simão Estácio da Silva, dirigido ao rei de Espanha, intitulado Intentos da jornada ao Pará, do qual transcreve alguns fragmentos em Raposo Tavares e a formação territorial do Brasil: "Este rio Pará, a que chamamos das Amazonas, tem dois nascimentos, um do rio Orellana nasce em Quito e serras do novo reino de Granada; outro, que chamam do Maranhão nasce um pouco ao norte do Serro de Potosi, nas serras do Peru e correndo mais de 700 léguas ao nordeste se ajunta com o de Orellana, mais de 400 léguas antes de entrar no mar" (1966: 1, 37-8). 8 Cópia do texto do Tratado de Madri acompanhado por outros documentos que se referem às fronteiras de Mato Grosso e da Amazônia em Reis, 1993: II, 116-29, em especial os artigos 3º e 6º-10º. Ainda, na mesma obra, "Tratado das Instrucções dos Comissários da Parte Norte. 24/06/1752", pp. 170-80. 9 A busca do "rio do Ouro" surge após o retorno da viagem de Pedro Teixeira (1636-39) desde a governação de Quito (vice-reino do Peru), divulgado pela publicação do Novo descobrimento do grande rio do Amazonas , do jesuíta Cristóvão de Acuña, em que este indica haver a expedição encontrado, pouco abaixo do rio Yurua (Japurá), aldeias de índios que portavam "pequenos brincos de ouro". (Figueroa, Acuña et alii. 1986. pp. 76-7). Na imaginação popular, a busca do rio de ouro unira-se à lenda da existência do lago Dourado, procurado durante dois séculos pelos espanhóis. Comenta Ferreira Reis que se o rio Dourado não foi encontrado, a abundância do ouro de aluvião encontrado às margens dos afluentes do Amazonas serviu para compensar essas jornadas. 10 Gadelha, 1980: 74-8, 80-2. 11 Ab'Saber, 2001: 58. Veja também a importante descrição do litoral norte do Oiapoque a Belém, pp. 60-76. 12 As dificuldades enfrentadas por Castelo Branco para a sua missão, documentada pela correspondência entre este capitão, as autoridades do Maranhão e de Lisboa e Madri estão em Reis: 1, 24-31. 13 Extinto em 1652, o estado do Maranhão e do Grão-Pará foi restaurado em 1654. O Amazonas, no entanto, sempre possuiu um capitão-mor, com residência permanente em Belém e dotado de regimento especial, que lhe conferia independência de ação militar. Em 1760, Belém passava a ser sede do estado do Maranhão e do Grão-Pará (Reis: 1, 56). 14 Ab'Saber, 2001: 78-89. 15 Ferreira Reis identifica o local no arraial de Franciscana, na confluência dos rios Napo e Aguarico, e transcreve trecho da ata do acontecimento (Reis: 1, 51-4). Cortesão também publicou documentos inéditos dessa expedição, em especial a importante "Relazion del gal. Pedro Tejera de el rio delas Amazonas para el S or Presidente. Ciudad de S an Fran co. del Quito, 02/01/1639", onde esclarece a autorização oficial de sua viagem desde Belém (Cortesão, 1965: 1, 423-34). 16 As capitanias criadas ou doadas por ordem cronológica foram: capitania Real do Grão-Pará (1621); capitania do Caeté (1627), a Feliciano Coelho de Carvalho, depois revogada em favor de Álvaro de Sousa (1634); capitania de Camutá (1637), a Feliciano Coelho de Carvalho; a importante e estratégica capitania do Norte (1637), a Bento Maciel Parente; capitania de Marajó (1655), a Antônio Sousa Macedo; capitania do Xingu (1681), a Gaspar de Sousa Freitas. A capitania de Gurupá não foi doada. Em todas estas capitanias, a coroa distribuiu sesmarias (Reis: 55). 17 Cf. Gadelha, 1994 e 1996. 18 Esse incidente originou a chamada "guerra do Acre" (1900-1903), conforme demonstra o estudo de Clara López Beltrán em Vangelista, 1996: 201-23.

Quais foram as principais fases do processo de ocupação e colonização da Amazônia?

Saiba quais foram os principais momentos dessa história:.
Os primórdios: Os portugueses descobrem a Amazônia..
Fim do século 19: Surge o ouro negro..
Uma segunda chance à borracha brasileira..
Anos 1960: "Integrar para não Entregar".
Anos 1970: O perigo do desmatamento..
Anos 1980: O ambientalismo de Chico Mendes..

Como foi o processo de ocupação da Amazônia?

A história de ocupação da Amazônia começa quando levas de imigrantes asiáticos chegaram ao vale do Amazonas há mais de 14 mil anos. No momento em que essas populações passaram a desenvolver a agricultura e viver numa mesma área de terra, sociedades indígenas diversas e mais complexas emergiram nessa região.

Quais foram os períodos de ocupação na Amazônia?

Estima-se que entre as décadas de 1870 e 1900, cerca de 300 mil nordestinos migraram para a região. Temendo uma possível internacionalização da floresta, os militares promoveram diversas obras de infraestrutura para integrar a Amazônia ao restante do país, a principal delas foi a Transamazônica.

Quais são os fatores da ocupação da Amazônia?

Fim do século XIX – Inicia-se o ciclo da exploração da borracha brasileira na Amazônia, motivado pela Revolução Industrial, as fábricas inglesas importam a matéria prima em grandes quantidades. Entre 1870 e 1900, aproximadamente 300 mil nordestinos migraram para a região para trabalharem nos seringais.